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sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

O privado e ó público - Parte III (final)

Adveio uma nova era.
Tempos de extrapolação do privado.
O que estava sob cortinas e paredes
Agora emerge sob todos os olhares
Gratuitamente, desmesuradamente.
O interesse pelo alheio não tem medidas. Nem preço.
O imenso esforço da modernidade em cobrir com um véu o interior
Agora se desfaz, liquidamente, sob olhos devorantes.
As vidas todas sob os signos dos outros vedores.
Não há espaço privado que não possa (e deva) ser visto pelo outro.
Todos andam me devorando apenas existindo.
Ex-istir = ser perpassado pelo outro.
O público se tornou publicidade.
A confissão de si, marketing.
O meu coração, outdoor colorido.
Como que num piscar de olhos,
Todas as fossas do mundo pipocaram como geiseres.
Jorraram os dejetos entupidores de gerações passadas.
O espaço se tornou a tela pintada de restos explodidos.
O que se fazia na privada,
Agora precisava ser exposto.
Sob a curadoria do virtual,
Os coniformes feco-cogitais do Ser se tornaram uma galeria.
Todos agora pincelam um pouco de suas mazelas por aí.
Facebooks, blogs, twitters, etc, etc, etc,
O inconfessionável encontrou seu espaço de necessidades fisiológicas.
Bananeiras high-techs.
O que o gato enterra não cabe mais na areia.
Tornamo-nos reféns felizes de um saber-alheio que nos incita.
Confesso-me, logo existo.
Vida atravessada.
A palavra íntimo tem dentro dela o timeo grego.
Honra, valor oculto.
Uma honra, pra ser honrada, tem que ser vista.
É próprio da intimidade ser penetrada.
É próprio dos limites inventados pela modernidade para o privado,
O desejo astucioso de se abrir como uma couve-flor.
Nem o Deus-Revelado-Oculto escapou.
O religioso invadiu espaços inabituais,
Mordeu a fruta e a serpente ao mesmo tempo.
Não há mistério que subsista à fome de ver!
Telepatia delirante.
Eu mesmo, no instante em que escrevo essas linhas purgantes,
Exponho meus intestinos pra ser visto.
Comentado, citado, copiado e criticado.
Ninguém mais suporta o silêncio eterno dos espaços infinitos de ser só "si".
O privado vagueia pelos ares, redes, teias, universos.
Tenho medo.
Fazer o quê! Tenho!
Temo pessoas (inclusive eu) que não conseguem erigir uma capela ao seu eu.
Temo verdades que não se escondem.
Temo intimidades que perderam o encanto mágico instigante.
Temo os mistérios que, de tanto obscuros, se revelaram sem pudor,
E vestiram camisas listradas para dançar no Bola-Preta até o Sol raiar.
Guardar um tiquinho de mistério é salvar-se.
Talvez, hoje, calar seja o maior discurso.
E escrever, tentativas vãs de continuar existindo.
Nos julgamentos públicos,
O Deus-Palavra simplesmente calou.
E não abriu a boca.

2 comentários:

mariab disse...

Que trilogia !! Fantástico ! Está tudo muito misturado...o público e o privado não se reconhecem mais como distintos.. equilíbrio é o segredo.
São tantos ergo sum... particularmente o “Amo ergo sum” é o meu preferido, é na medida em que o homem ama que se descobre a si mesmo. Em suas orações lembre-se de mim. Paz e Bem, um forte abraço.

mariab disse...

” Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna; ou melhor não me pergunto contesto. A resposta eu sei de cor, está estampada na distância e frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos “Bom dia”, quase que sussurrados (…) ”(Luís Fernando Veríssimo).
Missa de domingo especial, teve até musiquinha “Alegrai-vos sempre no Senhor, alegrai-vos no Senhor!1Ts5,16-24.Saudades !Estou orando por você sempre. Beijos.