O capote

Estou lendo "O Capote", de Nikolai Gógol.
Um homem ridículo descobre que os males de sua vida vêm da ausência de um capote de qualidade.
Ele luta para costurar um capote digno de seus anseios.
Quando consegue, o mundo muda ao seu redor.
Todos o reverenciam pelo capote novo.
Ele se renova também.
O capote trouxe a vida para aquele homem.
Eu estou costurando um capote novo.
E ele já me traz vida!

Suspiro

No alto da cruz, um suspiro.
Pentecostes ao expirar.
Um espírito expirado dá vida.
Um espírito entregue.
A carne também foi entregue.
Só porque a carne foi entregue houve expiração.
A carne expirou.
A carne é o lugar do espírito.
Eu estava expirando.
Últimos suspiros da carne entregue.
Tu, porém, vieste em forma de suspiro.
Entregando-me o hálito mais puro.
O amor é um hálito.
Os pés têm hálito.
Os pés se beijam.
Os pés chagados de Cristo me beijaram.
Tenho vida novamente.
Um suspiro me deu vida!

Um pouco da filosofia de Hegel

Qualquer pessoa deve ser tratada como alguém difícil.
A filosofia une aquilo que foi posto à parte.
Ser é também não-ser.
Sou o que gosto e o que desgosto.
Sou um ser que é suas próprias contradições.
Vivemos o Ser e não aceitamos as suas determinações.
O Ser também não é.
O Não-Ser também é.
O que é e o que virá a ser é, e não se esgota no que tem sido.
Manifestar-se é determinar-se.
A indeterminação é incapacidade de ser.
Se o infinito não se torna finito, ele não pode ser infinito, senão ele permanece em si mesmo.
Não basta ter algo em comum, é preciso ter o Comum como Algo.
Eu sou minha vida e minha vida são os outros.
Conhecer a história de alguém é conhecer o outro em sua totalidade.
Sou meu passado, presente e futuro.
Quando dois ou três estão juntos, a liberdade se dá.
Se a história não fosse, Deus não seria.
Conhecer algo significa experienciá-lo.
A pior das idéias que passa pela cabeça de um homem é maior do que qualquer coisa da natureza.
A arte mediatiza o imediato.
Uma religião que não viva aquilo que os homens sentem não é religião.
O artista, ao ver, entende!
Meu Deus, como eu amo filosofia!!!

Duas frases de ontem...

"O corpo destroçado na cruz o foi por afeto e não por defeito".
"A beleza atinge seu ápice no amor".

Riscos

O maior risco da vida é a própria vida.
Um risco pode ser algo que separa dois pontos.
Mas também pode ser uma seta em direção ao Ponto!
Um risco pode ser um substantivo ou um verbo.
Riscar... Arriscar... Triscar.
O verdadeiro risco é o de não arriscar-se a algo.
A fé é o grande risco da vida.
Um dia fomos riscados.
Ele arriscou-se para que, num rabisco, tudo existisse.
Coordenadas, Assimetria, narizes.
Não existe amor sem riscos.
E é justamente isso que nos enri(s)quece.
Enrisqueçamo-nos!
Só quem se arrisca é que pode se salvar!
Um risco salvou-me.

Um homem

Jesus Cristo, como te procuro...
Sua humanidade é minha meta.
Ando por caminhos diversos, mas sempre tu...
Sempre tu!
Vejo-te nos lugares mais improváveis.
Respiro-te em tudo que ama.
E chama.
Bebo-te.
Cuido-te.
Preciso desse homem presente em um amor novo.
Ele me cuida no amor.

CRIANÇA

O amor nos faz crianças.
Quando somos apanhados de surpresa pela paixão,
Tudo ganha cor e música.
Nossa alma quer brincar.
Nosso rosto se pinta.
Palhaços emudecidos pela vida.
Saltitamos entre palavras e bocas.
Fazemos da casa picadeiro.
Ser criança é enxergar a beleza em tudo.
E o amor é o tudo.
Só quem tiver um coração de criança entrará no céu.
Papai do céu gosta.
Dai-me, Papai do Céu, um nariz de criança.
Apaixonado por doce, bolinhas de sabão e cachorrinhos.
Dai-me um amor encriançante.
E brincaremos.
No parque de diversões da eternidade!

A maçã do meio do jardim

Ela estava lá!
Doce. Vermelha. Eterna.
Pendurada em um galho tênue.
Contemplada. Sussurrada.
Urrada.
A maçã pendurada e a mão esticada.
Ela envenenou-se.
A serpente se apossou. Acossou.
Evas, Adões, Anjos e deuses.
Todos eles a desejaram.
O pior veneno da maçã é o meio do jardim.
Não toque!
Não morda!
Não se aproxime!
Ainda haverá Evas de olhos fechados?
Vermelho de polpa.
Vermelho de lábio.
Carne.
Espera com sabor de folha de figueira.

Tecido

Hoje sinto que o tempo é de esperar.
Há grandes mudanças acontecendo.
Tecendo.
Sendo.

Aconteço-me contando.
Escrever pra mim é uma costura.
Tonsura.
Ternura.

O tempo me faz correr contra mim.
A vida escapa, morde.
Sacode.
Explode.

O sumo da existência é o que fica na mão.
Nele absorvo-me e calo.
Gargalo.
Falo.

Por que ricocheteio-me no silêncio?
E Tu? Em quem me Amas?
Dramas.
Chamas.

Voltei a ler Clarice

Eu precisava.
Descubro nela, a cada dia, uma nova palavra.
Palavra.
Ela me acende palavras escondidas.
Ela me toca, me afeta.
Clarice é a flor mais fina da língua portuguesa.
É a dama que me acompanha.
Amo-te Clarice.
Sua ânsia de pôr-se me fascina.
Vou contigo.
Opto-me por trilhar-te.
Perto do teu coração selvagem.

Não desperteis o amor!

O amor prefere ficar quietinho debaixo de uma coberta.
Dia frio! Ele deixa apenas a ponta dos pés pra fora.
O amor dorme insaciavelmente pelas pernas.
O amor detesta ser despertado.
A não ser que seja com café na cama.
Incrível como tocar no amor queima.
Ontem toquei na cerca elétrica com o nariz.
Queimou o cheiro da vida.
Decido-me hoje a não mais tocar o amor.
Prefiro que ele me toque.
Ainque que com choques úmidos e frios.
O amor é um choque!
Inesgotável matéria viva da existência!

Quero cuidar

Hoje amanheci com uma vontade enorme de cuidar.
De proteger.
De abrigar alguém sob minhas asas.
Sem sufocar.
No cuidado, Deus se revela.
Sou descuidado comigo.
O meu eu precisa cuidar pra viver.
Cuidando, cuido-me.
E protejo-me da fuga de mim.

Bauman: AMOR LÍQUIDO

Amar significa manter a resposta pendente ou evitar fazer a pergunta. Transofrmar um outro num alguém definido significa tornar indefinido o futuro. Significa concordar com a indefinibilidade do futuro.
No mar da incerteza, procura-se a salvação nas ilhotas da segurança.
Concordar com uma vida vivida, da concepção ao desaparecimento, no único local reservado aos seres humanos: aquela vaga extensão entre a finitude de seus feitos e a infinidade de seus objetivos e conseqüências.

Ronda (Essa é minha música hoje)

De noite, eu rondo a cidade,
A te procurar, sem te encontrar.
No meio de olhares, espio.
Por todos os bares, você não está.
Volto prá casa abatida,
desencantada da vida,
o sonho alegria me dá,
nele você está.
Ah, se eu tivesse
quem bem me quisesse,
esse alguém me diria:
Desiste, esta busca é inútil,
eu não desistia.
Porém, com perfeita paciência,
volto a te buscar, sem encontrar,
bebendo com outras mulheres,
rolando um dadinho, jogando bilhar.
E nesse dia, então,
vai dar na primeira edição:
Cena de sangue num bar
da Avenida São João.

Eu quero seguir o coelho

Alice no país das maravilhas.
Preciso de um coelho pra seguir.
O buraco já está aberto.
Ainda não sou. Nem de longe.'
Eu preciso da estabilidade de um país de maravilhas.
Meu país foi invadido por um exército.
Quero um país que me suba pelos poros.
Preciso descer.
Fuga. Fuga. Fuga.
Puro Teatro.
Não há tempo, não há nada.

O prato principal

Eu quero apenas o prato principal da vida.
Estou cansado dos aperitivos.
Cansado das entradas sem graça.
Das saladas que rodeiam e enganam.
O prato principal da vida é o amor.
É o que dá sustância.
Substância cálida.
Pode fazer mal. Não pelo excesso.
Pela fome.
Aquele que mais amou só deixou um mandamento:
"Alimentar-te-ás apenas do prato principal.
Não te insacies do supérfluo!"
Amor não é "quando".
É "onde"!