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sexta-feira, 29 de outubro de 2010

MASSADA E MAR MORTO

Nosso último dia em Israel.
Visitamos a Fortaleza de Massada, onde em 73 d.C., os romanos derrubaram o último reduto judaico da antiguidade. Aqui, no alto de um morro, às margens do Mar Morto, centenas de pessoas se suicidaram para não se entregarem aos exércitos inimigos. Foram fiéis à lei até o fim.
Respeito o gesto desses homens. Valorizo qualquer pessoa determinada.
Mas temo que uma palavra esteja acima da vida.
Temo que determinadas atitudes extremistas coloquem a lei acima do ser humano.
De fato, o fundamentalismo pode colocar pessoas reféns, pode erigir fortalezas inúteis.
O fundamento não pode estar nas alturas.
Ele pisa o chão da vida humana.

Depois, visitamos o mar Morto.
Ele tem esse nome porque não há vida nele.
Tudo é sal enxofre.
Lá a gente bóia. Não afunda.
Vive-se na superfície.
De fato, uma vida de superfície é sempre morta.
Que não tem a coragem de mergulhar em sua própria vida e história,
Jamais tocará o solo da verdade.
E boiará na transparência cretina das ilusões.

Não quero minha vida como uma fortaleza nas montanhas.
Não quero o Mar de minha história morto como sal.
Não quero a certeza vã de verdades criadas sobre areia.
Todas as verdades são cristais de sal.
Eu prefiro tocar a lua.
E reluzir estrelas no deserto de corações opacos.
Nunca será verdadeiramente feliz,
Quem não experimentou olhar o céu de Israel em noite de lua cheia.
Obrigado Israel.
Paz sobre ti Jerusalém!

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

JERUSALÉM

Ruas de ouro. Mar de Cristal.
Por tuas portas hoje adentrei.
Cidade Santa.
É inexplicável a sensação de cruzar as muralhas de Jerusalém.
Carreguei nos ombros milhares de anos de história.
Muro das Lamentações. Via Dolorosa. Santo Sepulcro.
Me impressionaram duas coisas:
A sombra que faz sempre em Jerusalém: sob as pedras de areia da Cidade Mãe parece nunca fazer Sol.
E a Igreja de Pedro Gallicantus: onde Pedro negou o Cristo.
Ali experimentei a dor da traição.
Ele foi traido por Judas, mas a traição mais dolorosa foi a de Pedro.
Ele confiou no amigo. O amigo o abandonou na hora da dor.
Entre Judas e Pedro há uma diferença.
Para um, desespero.
Para outro, a confiança na misericórdia.
Nessa cidade multiétnica, multireligiosa, multilingüe,
Somos convidados a tocar o mundo com a alma.
Respirar Jerusalém é respirar um pouco do humano em forma de grito.
Aqui Deus morreu para reviver o homem.
Aqui o céu quis beijar a terra.
Ser beijo de Deus na Terra!
Isso tu me ensinaste Jerusalém!

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Belém

Hoje visitamos Belém.
Aqui a tradição diz que nasceu o Salvador.
Davi. Jesus.
Aqui os caminhos de duas histórias se cruzam.
Saber que um Deus se faz menino,
É a grande confusão do universo.
Curvar-se diante de um menino e adorá-lo,
Não é pra qualuqer um.
A estrela conduziu os pastores.
Hoje, senti vergonha de ser humano.
Quando vi um muro separando povos irmãos.
Muro alto.
Vida baixa sem se abaixar.
Os homens jamais guerrearam por causa de religião.
Nunca alguém levantou uma arma por causa de deus algum na história.
Levantam o nome do Senhor em vão para justificar interesses esdrúxulos.
Todo muro é um grito de idiotice humana.
Ele destruiu muros.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

LÁZARO

Celebramos hoje na casa de Lázaro. O amigo de Deus.
Jesus teve amigos. Chorou por eles.
Passando por Betânia, ele trouxe à vida um amigo morto.
Rezando, recordei-me de meus grandes amigos.
E tenho alegria de dizer que os tenho.
Uns já passaram, estão longe.
Outros o tempo se encarregou de aproximar ainda mais.
Meus amigos, que me amam pelo que sou.
Eu não seria nada sem vocês.
Mesmo na distância, imposta pelo tempo, pela vida, e até por mim.
Sei que vocês farão parte de minha vida para sempre.
Meu Pai (melhor amigo), meus irmãos, Wagner, John, Miro, Elias, Meu primo Alex, Pe. Carlos SCJ, Pe. Milton Gonzaga, Arianas, Cristiano Borro, Luís Otávio, Jader, Meire e Luiz, Evandro Reis, Patrícia e Nilson, Lúcio, Ivonil Parraz, Mons. Miguel e Expedito, Rafael Chico, Yonara, Pe. Luciano, Alessandra, Lídia, Clara, Pe. Cléber e todos de BH, Pe. Vitório, José Martins. E Pe. Wilson Ramos pra quem hoje eu rezei de modo especial.
Sim, eu tenho amigos.
E eles me ressuscitam.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Caná da Galiléia

Celebramos a renovação do matrimônio de várias pessoas do nosso grupo.
É lindo saber que Jesus iniciou sua vida pública numa casamento.
O amor humano é o maior sinal da vida divina em nós.
Ele supera todas as religiões, doutrinas.
Papas, Patriarcas, Rabinos...
Todos esses devem ser caminhos para a realização desse amor.
Tenho pena das religiões quando fazem dos apaixonados, seres apáticos.
Tenho pena do invólucro triste que envolve pessoas infelizes apegadas a deuses sem cor e sem vida.
Oxalá minha fé cristã não se reduza nunca a uma talha cheia de nada.
Oxalá minha vida seja de talha de água.
Para que em mim ele realize o milagre.
E que meu vinho inebrie o mundo de esperança.

Tiberíades

Estou a 100 metros do Mar da Galiléia.
Lago de Genesaré.
Daqui provém toda água dos judeus.
Aqui Ele chamou os primeiros discípulos.
Um barco. Vários peixes.
Por todo lado pegadas do Mestre.
Sinais de sua vida.
Fico pensando em minha vida.
Quando eu morrer, que pegadas deixarei?

sábado, 23 de outubro de 2010

ISRAEL - TEL-AVIV

Enfim chegamos a Israel.
Oito horas pelo deserto.
Não há mais camelos.
Mas há estradas boas. Para carros que não bebem água.
Há indústrias. E muitas armas.
Há sorrisos.
Bocas com dentes.
Tel-Aviv é cosmopolita.
Moderna. Atraente. Multicultural.
O mundo se ajoelha diante da persistência de Israel.
Isso aqui não é simplesmente um país.
É um povo gritando e sussurrando no ouvido do universo:
Adore-me em Javé.

MAR VERMELHO

O mar vermelho é azul.
Ele beija um deserto ocre, lambendo as feridas das guerras.
Povos irmãos.
Camelos de duas corcovas.
E crianças desdentadas sorrindo um não-sei-quê de agonia lenta.
Dar um dólar é desprezo.
É pisar o mundo com a arrogância de uma nota.
Hoje eu retratei o umbigo do universo.
Cólicas em forma de conflitos.

MONTE SINAI

Uma da madrugada.
Mais de mil peregrinos de todas partes do mundo se dirigem a um monte.
Montanha árida. Pedra e pó rezando com as mãos erguidas ao céu.
O monte fala conosco.
Camelos. Beduínos. Chá. Charuto mal-cheiroso.
O mundo roga subindo o Sinai.
Deus me despertou para subir.
Sonho profético. Ele quer expiar minha culpa.
No alto, ele me fez ver o nascer de um Sol enorme.
Um Sol que beija todas as nações do mundo no Sinai.
Os antigos egípcios chamavam o Sol de deus.
De fato, há em cada Sol que nasce um deus brilhando.
Ele me fez subir.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

EGITO

Estou em viagem ao Egito e a israel.
Me impressionou o desejo do ser humano de ser eterno.
As pirâmides hoje me lembraram aquilo que nos move: o desejo de permanecer.
De um modo ou de outro, os faraós permaneceram.
São eternos na memória do povo.
O Egito não existiria sem eles.
A pirâmide faz o mundo convergir ao Egito.
Eterno é o que fica na memória da humanidade.
O Rio Nilo é um canal de eternidade.
Por ele a vida pulsa no coração do Egito.
Cada egípcio traz o Rio Nilo no peito.
Hoje aprendi que a religião nos faz eternos.
Ela nos cria memória.
Ela perpetua o desejo do "sempre" na humanidade.
Para não nos perdermos no vazio do consumo.
Entretanto, as pirâmides também me questionaram:
Como as religiões podem conviver com a miséria humana?
Como podem ser plenamente religiosas pessoas que olham ao redor e só encontram fome, miséria e injustiça?
Egito, Brasil, Mundo.
De fato ainda não somos religiosos o bastante.
Não estamos re-ligados ao bem comum.
Adoramos somente o bem pessoal.
Esquecemo-nos que o Pai é Nosso!
O Cristo não construiu pirâmides.
Seu templo era o corpo, a vida humana!
infelizmente, depois, construimos catedrais para permanecermos.
E tentamos infelizmente ser eternos por meio de pedras frias.
O caminho do Nazareno é outro.
Contra a nossa pretensão de sermos enormes,
Ele se fez pequeno.
Como um papiro entrelaçado, simples.
Onde podemos escrever o amor através do bem.
E nos tornarmos eternos!
SÓ O AMOR ETERNIZA O HOMEM.
Senhor, ensina-me a tornar eternas as pessoas.
E construir templos vivos ao redor do mundo.
Não em pirâmides frias e altas.
Não em catedrais úmidas e geladas.
Não em palavras bonitas,
Mas em carne que pulsa.
E que dance até o "sempre" tocar o chão do nosso "hoje"!

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Carta do Pe. José Comblin à Dom Demétrio Valetini (Bispo de Jales/SP)

Querido dom Demétrio

Quero publicamente agradecer-lhe as suas palavras esclarecedoras sobre a manipulação da religião católica no final da campanha eleitoral pela difusão de uma mensagem dos três bispos da comissão representativa do regional Sul I da CNBB condenando a candidata do atual governo e proibindo que os católicos votem nela.

Graças ao senhor, sabemos que essa divulgação do documento da diretoria de Sul 1 não foi expressão da vontade da CNBB, mas contraria a decisão tomada pela CNBB na sua ultima assembléia geral, já que esta tinha decidido que os bispos não iam intervir nas eleições.

Sabemos agora que o documento dos bispos da diretoria do regional Sul 2 foi divulgado no final de agosto, e durante quase um mês permaneceu ignorado pela imensa maioria do povo brasileiro.

Agora, dois dias antes das eleições, um grupo a serviço da campanha eleitoral de um candidato, numa manobra de evidente e suja manipulação, divulgou com abundantes recursos e muito barulho esse documento, criando uma tremenda confusão em muitos eleitores. Pela maneira como esse documento foi apresentado, comentado e divulgado, dava-se a entender que o episcopado brasileiro proibia que os católicos votasse nos candidatos do PT e, sobretudo na sua candidata para a presidência. Dois dias antes das eleições os acusados já não podiam mais reagir, apresentar uma defesa ou uma explicação. Aos olhos do público a Igreja estava dando o golpe que sempre se teme na véspera das eleições, quando se divulga um suposto escândalo de um candidato. Era um golpe sujo por parte dos manipuladores, já que dava a impressão de que o golpe vinha dessa feita da própria Igreja.

Se os bispos que assinaram o documento de agosto, não protestam contra a manipulação que se fez do seu documento, serão cúmplices da manipulação e aos olhos do público serão vistos como cabos eleitorais.Se a CNBB não se pronuncia publicamente com muita clareza sobre essa manipulação do documento por grupos políticos sem escrúpulos, será cúmplice de que dezenas de milhões de católicos irão agora, no segundo turno votar pensando que estão desobedecendo aos bispos.

Seria uma primeira experiência de desobediência coletiva imensa, um precedente muito perigoso. Além disso, certamente afetará a credibilidade da Igreja Católica na sociedade civil, o que não gostaríamos de ver nesta época em que ela já está perdendo tantos fiéis.

Se o episcopado católico deixa a impressão de que a divulgação desse documento nessa circunstância representa a voz da Igreja com relação às eleições deste ano, muitos vão entender que isso significa uma intervenção dos bispos católicos para defender o candidato das elites paulistanas contra a candidata dos pobres.

Os pobres têm muita sensibilidade e sentem muito bem o que há na consciência dessas elites. Sabem muito bem quem está com eles e quem está contra eles. Vão achar que a questão do aborto é apenas um pretexto que esconde uma questão social, o desprezo das elites, sobretudo de São Paulo pela massa dos pobres deste país.

Milhões de pobres votaram e vão votar na candidata do governo porque a sua vida mudou. Por primeira vez na história do país viram que um governo se interessava realmente por eles e não somente por palavras.

Não foi somente uma melhoria material, mas antes de tudo o acesso a um sentimento de dignidade. “Por primeira vez um governo percebeu que nós existimos”. Isso é o que podemos ouvir da boca dos pobres todos os dias.

Um povo que tinha vergonha de ser pobre descobriu a dignidade. Por isso o voto dos pobres, este ano, é um ato de dignidade. As elites não podem entender isso. Mas quem está no meio do povo, entende.

Os bispos podem lembrar-se de que a Igreja é na Europa o que é, porque durante mais de 100 anos os bispos tomaram sempre posição contra os candidatos dos pobres, dos operários. Sempre estavam ao lado dos ricos sob os mais diversos pretextos. E no fim aconteceu o que podemos ver. Abandonaram a Igreja. Cuidado! Que não aconteça a mesma coisa por aqui!

Os pobres sabem, são conscientes e sentem muito bem quando são humilhados. Não esperavam uma humilhação por parte da Igreja. Por isso, é urgente falar para eles.

Uma declaração clara da CNBB deve tranqüilizar a consciência dos pobres deste país. Sei muito bem que essa divulgação do documento na forma como foi feita, não representa a vontade dos bispos do regional Sul 1 e muito menos a vontade de todos os bispos do Brasil. Mas a maioria dos cidadãos não o sabe e fica perturbados ou indignados por essa propaganda que houve.

Não quero julgar o famoso documento. Com certeza os redatores agiram de acordo com a sua consciência. Mas não posso deixar de pensar que essa manipulação política que foi a divulgação do seu documento na véspera das eleições, dava a impressão de que estavam reduzindo o seu ministério à função de cabo eleitoral. O bispo não foi ordenado para ser cabo eleitoral. Se não houver um esclarecimento público, ficará a imagem de uma igreja conivente com as manobras espúrias

Dom Demétrio, o senhor fez jus à sua fama de homem leal, aberto, corajoso e comprometido com os pobres e os leigos deste país. Por isso, o senhor merece toda a gratidão dos católicos que querem uma Igreja clara, limpa, aberta, dialogante.

Demonizar a candidata do governo como se fez, baseando-se em declarações que não foram claras, é uma atitude preconceituosa totalmente anti-evangélica.

Queremos continuar confiando nos nossos bispos e por isso aguardamos palavras claras.

Obrigado, dom Demétrio.José Comblin, padre e pecador.

5 de outubro de 2010

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

O óbvio (mais um pouco da fase Nelson Rodrigues)

"O encontro com o óbvio é sempre uma experiência vital.
Plástica.
Inexcedível.
Talvez por ser tão raro.
Só os profetas enxergam o óbvio". (N.R.)

Sinto-me cercado do óbvio e não consigo largá-lo.
Vida.
Medos.
Dores.
Saltos.
O óbvio grita. Estrebucha em forma de lei.
O óbvio é a lei dos homens.
O amor nunca será óbvio.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Nelson Rodrigues sobre o teatro

Morbidez? Sensacionalismo?
Não. E explico: a ficção, para ser purificadora, precisa ser atroz.
O personagem é vil, para que não o sejamos.
Ele realiza a miséria inconfessa de cada um de nós.
A partir do momento em que Ana Karenina, ou Bovary, trai, muitas senhoras da vida real deixarão de fazê-lo. No "Crime e Castigo", Raskolnikov mata uma velha e, no mesmo instante, o ódio social que fermenta em nós estará diminuído, aplacado.
Ele matou por todos.
E, no teatro, que é mais plástico, direto, e de um impacto tão mais puro, esse fenômeno de transferência torna-se mais válido.
Para salvar a platéia, é preciso encher o palco de assassinos, de adúlteros, de insanos e, em suma, de uma rajada de monstros.
São os nossos monstros, dos quais eventualmente nos libertamos,
Para depois recriá-los!

Dor

A dor conduz o ser humano ao encontro de si.
Fazia tempo que não sentia tanta!
Ela veio com força. Sutil. Silenciosa.
Quase que pedindo licença para me ensinar algo.
"Deixa-me instruir-te", dizia ela.
A dor incita respostas. E motiva perguntas:
"Para que tudo isso?"
"Para onde vamos?"
A dor suscita coragem para afirmar-se.
Nela somos remetidos ao lugar único que ocupamos no universo.
Só nós sentimos nossas dores.
Ninguém as sente por nós.
Na dor, o ser humano é lançado a uma solidão extremamente ímpar.
É a nossa dor e pronto!
O corpo grita cuidado.
Ele levanta a mão e diz: "Estou aqui!"
A dor é o suspiro do corpo exausto.
No fundo, cada ser humano é uma dor escondida.
Obrigado pela dor que me faz voltar ao que sou.
Único. Irremediavelmente único!