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quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

In-verso

Ele não cabe em um Objeto.
Muito menos em imagens feitas do barro de nossas conceituações.
E, assim, fugitivo, e imensamente Outro,
Ele não se dá com o nominável.
Mas com toda palavra recolhida ele dá.
De tão Todo, fez-se Parte.
E habita o paraíso das possibilidades humanas.
Calado. Intenso. Despido.
Não O procure sobre os pedestais.
Mas sob os pés calejados.
Conselho: vá descalço!
Não O procure nas praças centrais,
Procure-O nos becos.
Conselho: vá de madrugadinha!
Não O procure nas Certezas,
Procure-O nos que se perguntam.
Quanto mais o homem se mascara de divino,
Mais o divino se mostra humano.
Ele nos existe.
Ele nos crê.
Ele nos reza.
Desculpem-me, eu não tenho nenhuma teoria para explicar o divino.
Aliás, explicá-lo é um suicídio.
E não faltam aqueles que buscando explicá-lo, o assassinam.
Ao senti-lo tocando a maçaneta,
Minhas teorias se derretem como cera...
E O ouço sussurrando:
É muita Meta, pra pouca Física!
Por isso eu o engulo,
E o sinto percorrendo minhas veias fugídias.
E quanto mais o per-corro em mim,
Mais O existo.
O divino se fez mesa.
E habitou entre nós.
Eu não rezo o que deixaram por escrito.
Eu rezo o que Ele poetiza em mim.
Deus não é prosa.
Deus é verso.
Con-verter-se também é In-verter-se!

domingo, 2 de dezembro de 2012

A formiga

Ela não sabia para onde ia.
Muito menos o porquê daquele grão de açúcar sobre o dorso.
Mas ela tinha antenas.
E patas miúdas e leves que a conduziam para longe de qualquer chão.
Assim perambulava a formiga, minúscula, e insética.
Ela corrigiu seu caminho.
E a correição sinuosa foi ficando para trás,
Como uma procissão acesa pelas vielas de terra e grãos pisada pelos homens enormes.
A formiga, apesar de continuar com o doce do percurso nas costas,
Não se contentava mais com uma existência feita de segmento-seguimento.
Passou a se seguir.
E a conduzir seu torrãozinho pelas vielas tortuosas da solidão.
Vermelha, ela era feita de terra.
E um pouco de veneno também.
A cada passo distante da fila,
Sentia-se insegura, e atraída pela imensidão perfurante do universo.
A formiga tinha um gosto terrível de terra na boca.
E porque não o cuspia, era uma terráquea.
A chuva viria, e em breve.
Não restaria mais abrigo.
Nem o calor das "outras",
Muito menos o beijo cálido das semelhantes no encontro diário.
Ela estava só.
Ela, o açúcar e o absurdo da existência.
Alguém já viu uma lágrima de formiga?
Eu já. E posso garantir que é enorme.
E líquida. Inexplicavelmente líquida.
Às vezes a formiga se sentava à beira do riacho...
E se via refletida na imensidão oceânica à sua frente.
E era nesses momentos que o passado feito de filas e ósculos
Se apresentava graúdo...
E inútil.
A formiga não tinha mais formigueiro.
Tinha apenas o açúcar redondo sobre os ombros frágeis.
E foi exatamete aí, que ela sentiu o peso do universo sobre si.
Sim, um grão de açúcar tem o mesmo peso do mundo.
Assim, aprendeu calada que era no carregar dos grãos que estava sua sina.
E não nas linhas tortuosas da correição movente.
Ela adoçava o pisável da história,
E isso bastava,
Ainda que com isso fosse pisada também.
Nunca mais a vi.
Talvez eu mesmo a tenha pisado por aí...
Ando tão distraído.
As formigas nunca viram borboletas.
E acredite, ainda assim,
Podem voar.