Só pode ser feliz na vida quem sentiu um peso de uma vida desamaiando sobre seus braços.
O desfalecer de alguém,
Os olhos virados sob o respirar trôpego,
Os braços trêmulos,
Os lábios secos,
A pele fria e arrepiada pelo sangue fugídio.
Segurar o peso do mundo.
Segurar corpos e sonhos.
Quero fazer da minha vida um sopro.
Calma, respire.
vai passar!
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terça-feira, 31 de agosto de 2010
sexta-feira, 27 de agosto de 2010
Um casal de velhinhos
Ele e Ela tinham mais de setenta.
Ele tinha tido um derrame. Ela cuidava.
Ela tinha cabelos brancos e usava óculos. Ele também.
Ele não falava. Ela falava por ele. Dele. Nele.
Ela lhe dava banhos e carinho. Ele piscava e apontava "jóia" com o polegar.
Ele comia pouco. Ela, atenta, dizia que o que sobrava era pro "santo".
Ela sofria. Ele sofria.
Ele resmungava de dor. Ela sorria.
Ela era o cuidado em forma de gente. Ele, cuidado, era mais gente.
Ele e Ela eram o amor em forma de casamento.
Os dois, juntos, valorizavam aquilo que chamam matrimônio.
E gritavam pro mundo:
"Vale a pena viver pra alguém!"
Velhinhos, solitários, ele e ela...
Descortinavam a eternidade em forma de companhia!
Ele tinha tido um derrame. Ela cuidava.
Ela tinha cabelos brancos e usava óculos. Ele também.
Ele não falava. Ela falava por ele. Dele. Nele.
Ela lhe dava banhos e carinho. Ele piscava e apontava "jóia" com o polegar.
Ele comia pouco. Ela, atenta, dizia que o que sobrava era pro "santo".
Ela sofria. Ele sofria.
Ele resmungava de dor. Ela sorria.
Ela era o cuidado em forma de gente. Ele, cuidado, era mais gente.
Ele e Ela eram o amor em forma de casamento.
Os dois, juntos, valorizavam aquilo que chamam matrimônio.
E gritavam pro mundo:
"Vale a pena viver pra alguém!"
Velhinhos, solitários, ele e ela...
Descortinavam a eternidade em forma de companhia!
quarta-feira, 25 de agosto de 2010
Santo Limitado
O santo é no mundo o grito do possível!
O corpo é para o santo, o lugar do impossível.
O impossível é, para todos, o grito do medo!
E o medo, eternamente presente, é o corpo do futuro.
Limitado. Único. Flácido.
Entre corpos santos e impossíveis, faço meu mundo.
Entre todos grito meu medo.
Eternamente flácido, limito-me a um corpo.
E nele sou presente único.
Santo Limitado.
O corpo é para o santo, o lugar do impossível.
O impossível é, para todos, o grito do medo!
E o medo, eternamente presente, é o corpo do futuro.
Limitado. Único. Flácido.
Entre corpos santos e impossíveis, faço meu mundo.
Entre todos grito meu medo.
Eternamente flácido, limito-me a um corpo.
E nele sou presente único.
Santo Limitado.
Sobre o amor e o tempo
O tempo é a tensão constante entre o desejo irreconciliável e o inferno das possibilidades. Somos completamente reféns do possível. Quando vislumbramos algum fato ou dimensão até então não alcançada, movemos todos os nossos afetos em direção a esse algo e a ele servimos completamente. O tempo se coloca então como uma corda estendida entre o desejo e o possível. Não ter possibilidades é viver sem tensões. Não ter desejo é permanecer com a corda arriada, e sem fluxo de energia no corpo. O corpo é o lugar onde as tensões habitam. Nele, o impossível amedronta e o possível grita socorro. Render-se aos apelos insaciáveis do desejo é afrouxar a corda também. Preferir o irremediável sim ao possível já é fugir do solo seguro do hoje. Não há hoje para quem tem um possível! Não há impossível para quem deseja! O amor é o lugar do salto. É um possível sempre adiado. É uma corda estendida na direção contrária, pela qual poucos atravessam. O amor é a resposta do impossível! Este, eternamente refém do medo, incendeia corpos e cordas e nos ensina a dizer, no hoje, o que esperamos amanhã. O amor é o que possibilita o desejo. E impossibilita o tempo.
sexta-feira, 13 de agosto de 2010
Veias furadas
Hoje fui fazer exame de sangue.
Levei uma porção de picadas.
Não acharam minha veia. Meu sangue se escondeu.
A explicação: Minhas veias se comprimiram!
Fico imaginando que a vida funciona do mesmo modo.
Somos chamados, como agulhas finas, a entrar em veias escondidas.
O ser humano é uma veia comprimida entre medo e coragem.
O mundo é uma veia.
Nele percorrem litros e litros de vidas fluídas e passageiras.
Deus me deu uma veia para eu achar.
E furar.
Deus me deu uma veia longa e contínua que insiste em se comprimir.
Tenho medo de picar, picar, picar e não achar nada em mim.
Tenho medo de uma geração que não se deixa penetrar por nada.
Dói ser furado.
Ser agulha dói também.
Ela teme a ansiedade complexa do sistema circulatório.
Ela teme a fluidez incessante da vida.
Ó Deus, dá-me a graça de penetrar não apenas veias...
Mas também corações.
E pulsar o mundo com minha existência.
E serei sangue quente.
Fervendo corpos e almas.
Levei uma porção de picadas.
Não acharam minha veia. Meu sangue se escondeu.
A explicação: Minhas veias se comprimiram!
Fico imaginando que a vida funciona do mesmo modo.
Somos chamados, como agulhas finas, a entrar em veias escondidas.
O ser humano é uma veia comprimida entre medo e coragem.
O mundo é uma veia.
Nele percorrem litros e litros de vidas fluídas e passageiras.
Deus me deu uma veia para eu achar.
E furar.
Deus me deu uma veia longa e contínua que insiste em se comprimir.
Tenho medo de picar, picar, picar e não achar nada em mim.
Tenho medo de uma geração que não se deixa penetrar por nada.
Dói ser furado.
Ser agulha dói também.
Ela teme a ansiedade complexa do sistema circulatório.
Ela teme a fluidez incessante da vida.
Ó Deus, dá-me a graça de penetrar não apenas veias...
Mas também corações.
E pulsar o mundo com minha existência.
E serei sangue quente.
Fervendo corpos e almas.
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
APOTEÓSE DO ABSURDO (por Fernando Pessoa)
Sigo às vezes em mim, imparcialmente, essas coisas deliciosas e absurdas que eu não posso poder ver, porque são ilógicas à vista,
Pontes sem donde nem pra onde,
Estradas sem princípio nem fim,
Paisagens invertidas -
O absurdo, o ilógico, o contraditório,
Tudo quanto nos desliga e afasta do real e do seu séquito disforme de pensamentos práticos e sentimentos humanos e desejos de ação útil e profícua.
O absurdo salva de chegar a pesar de tédio aquele estado de alma que começa por se sentir a doce fúria de sonhar.
Absurdemos a vida, de leste a oeste.
Pontes sem donde nem pra onde,
Estradas sem princípio nem fim,
Paisagens invertidas -
O absurdo, o ilógico, o contraditório,
Tudo quanto nos desliga e afasta do real e do seu séquito disforme de pensamentos práticos e sentimentos humanos e desejos de ação útil e profícua.
O absurdo salva de chegar a pesar de tédio aquele estado de alma que começa por se sentir a doce fúria de sonhar.
Absurdemos a vida, de leste a oeste.
terça-feira, 10 de agosto de 2010
A vida alheia
Estou cada vez mais convicto de que aquilo que de fato interessa no mundo é a vida dos outros. É incrível a voracidade como a vida alheio instiga os corações humanos. No fundo, cada pessoa é condenada ao outro como refúgio último de seus males e anseios. Somos fadados a descobrir, vasculhar, varrer, espionar o outro como se ele fosse nossa tábua de salvação. Vejo pessoas que já não vivem senão para os outros. Vivem a vida alheia e nada mais. Esqueceram da própria, talvez porque tenham se esquecido de que a sua própria vida também é alheia a outrem. A beleza da existência não está em abandonar a vida dos outros. É impossível. Todos as desejamos como nossas. A beleza da vida está em saber que somos outros para alguém. E que nossa vidinha, por minúscula que seja, é cobiçada e ansiada por muitos.
Ó Deus, Outro dos outros, ensina-me a olhar para a vida dos outros como reflexo da minha. E nelas, te verei em cada passo estranho e em cada olhar esguio.
Ó Deus, Outro dos outros, ensina-me a olhar para a vida dos outros como reflexo da minha. E nelas, te verei em cada passo estranho e em cada olhar esguio.
sexta-feira, 6 de agosto de 2010
Indefinibilidade
Amar significa manter a resposta pendente ou evitar fazer a pergunta.
Transformar um outro num alguém definido significa tornar indefinido o futuro. Significa concordar com a indefinibilidade do futuro.
Ser indefinido é ser futuro!
É não ter fim.
Transformar um outro num alguém definido significa tornar indefinido o futuro. Significa concordar com a indefinibilidade do futuro.
Ser indefinido é ser futuro!
É não ter fim.
terça-feira, 3 de agosto de 2010
Esperar
O verdadeiro significado da vida está na arte de esperar.
Ah, como seríamos mais felizes se aprendessemos isso!
A criação divina se deu no tempo e, esperadamente, em sete dias.
O ser humano é um ser de tempo.
Ele conta horas e minutos e, se possível, segundos!
Milionésimos de segundos.
Ele foge, como um animal acossado, da armadilha cruel que a vida lhe prepara.
A cadência cega dos dias é uma grande armadilha.
Nela somos induzidos a não ver o tempo.
Nos esquecemos de que estamos em movimento contínuo rumo ao fim.
O fim. Sim, ele também tem o seu tempo.
Terminar a vida é terminar nossa contagem progressiva.
Nunca esperamos o fim.
Por isso, pensar nele nos desespera.
Desesperar é o antônimo de esperar!
Desesperado é o que cansou de esperar.
Devemos esperar por tudo:
Sucesso, prosperidade, emprego, pessoas em aeroportos, bolos de chocolate no forno.
Tenho medo de uma geração que não espera.
Pois não será mais geração.
Será aborto.
Ah, como seríamos mais felizes se aprendessemos isso!
A criação divina se deu no tempo e, esperadamente, em sete dias.
O ser humano é um ser de tempo.
Ele conta horas e minutos e, se possível, segundos!
Milionésimos de segundos.
Ele foge, como um animal acossado, da armadilha cruel que a vida lhe prepara.
A cadência cega dos dias é uma grande armadilha.
Nela somos induzidos a não ver o tempo.
Nos esquecemos de que estamos em movimento contínuo rumo ao fim.
O fim. Sim, ele também tem o seu tempo.
Terminar a vida é terminar nossa contagem progressiva.
Nunca esperamos o fim.
Por isso, pensar nele nos desespera.
Desesperar é o antônimo de esperar!
Desesperado é o que cansou de esperar.
Devemos esperar por tudo:
Sucesso, prosperidade, emprego, pessoas em aeroportos, bolos de chocolate no forno.
Tenho medo de uma geração que não espera.
Pois não será mais geração.
Será aborto.
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