Visitas

domingo, 8 de janeiro de 2012

Epifania e Cracolândia

Epifania significa manifestação.
Tornar algo público, expor, fazer ser visto.
Tirar de dentro e apresentar ao mundo.
Escrever é um ato epifânico.
É tirar do ventre algo que chuta.
É tornar visível uma dor, um grito, um suspiro calado.
Há epifanias por todo canto.
A mulher grávida é epifania da vida insistente.
O salário é epifania do esforço.
O raio é epifania das energias do céu.
E a lágrima é epifania da alma.
Hoje, todavia, uma foto foi epifania para mim.
No jornal, detalhes da mão de um usuário de crack.
A polícia, que empunhava armas com mãos fechadas,
Expulsou os dependentes químicos de uma rua que não tinha mais nome.
Tinha apelido: cracolândia.
Os usuários vagavam pelas ruas do centro de São Paulo, como que num êxodo.
Não havia mais salgueiros para harpas serem penduradas na Babilônia.
As mãos rachadas e queimadas da criança-refém da droga
Expunham um calvário silencioso.
Amaldiçoados os que vendem pedras de crack às crianças.
Amaldiçoados os políticos-Herodes que sustentam demagogias sobre uma parcela da população já ferida pelo vício maldito.
Os dedos daquela criança estavam esturricados.
Estavam sedentos.
A pior droga é a indiferença.
Dos que passam pra lá e prá cá e não enxergam vidas além de "nóias".
O maior vício é o de tratar pessoas como objetos de interesses políticos.
E seres humanos como insetos a serem dedetizados de nossa suposta harmonia social.
Dependente é aquele que não consegue se manifestar.
É o anti-epifânico.
É o que se cala diante da dor alheia e dá de ombros como que dizendo:
"-Ninguém mandou cair na droga".
Hoje, se os magos viessem do Oriente novamente,
Não parariam em Belém.
Iriam para Rua Glete, e suas imediações,
E abririam seus cofres diante da humanidade submetida ao descaso.
Os olhos estalados de um usuário de crack
São as estrelas nos conduzindo a um novo presépio.
Onde a humanidade grita com dedos rachados
E corações frágeis.
Que o Senhor nos liberte do pior vício que já existiu.
O vício do silêncio.
A cracolândia hoje é Belém.
Ali, um Menino chora com as mãos estendidas,
Enquanto espera pelos nossos cofres a serem abertos.
Corramos enquanto ainda há estrelas no caminho.

Um comentário:

mariab disse...

“As pessoas não podem ser tratadas como lixo humano que deve ser varrido para debaixo do tapete”(Antonio Carlos Malheiros, coordenador da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça SP) . Tirar a “Cracolândia itinerante” das vistas do eleitor, depois tudo volta ao que era!
Là na Santa Ifigênia o que sentia por esses indivíduos considerados “indesejáveis” era pena e muito, muito medo... sabia que eram filhos de Deus, mas não os acolhia como meus irmãos...como dizíamos “Tirando os “nóia” o bairro é bom! Méritos ao centro de convivência “É de Lei “ .