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segunda-feira, 5 de março de 2012

Misturar

Eu gosto de feijoada porque é misturada.
De repente, assim, sem mais nem menos,
E sem pedir permissão,
Paio e couve se tocam.
E a laranja bóia plena no feijão preto acoentrado.
A mistura é o tempero da vida.
Deus, que criou o universo separando,
Ensinou o ser humano a misturar.
O puro é chato.
A feijoada é saborosa.
O Brasil é bom porque aqui não há pureza.
A miscigenação abençoou-nos por gerações infinitas
E fez desse povo S.R.D. (ou vira-lata, para os rodrigueanos)
Um pedacinho da eternidade.
Aqui é um tal de pé, rabo, orelha e costelinha
Abraçando farofa pra tudo que é lado.
O amor, pra ser amor, tem que ter química.
E química é mistura.
A química nunca é pura.
O amor também não.
Atenção, falo de pureza aqui no sentido figurado,
De não-misturabilidade dos seres.
Explico-me antes que os pseudo-puros acendam fogueiras.
O amor tem um quê de feijoada.
Ele une pessoas.
Ele é feito de samba.
Ele é absurdamente saboroso.
E dá azia às vezes.
Não, nunca coma uma feijoada sozinho.
Tal como o amor, ela só alimenta quando dividida.
Comer feijoada é coisa que exige ocasião.
Exige misturar-se em um caldo grosso, inquieto,
Gorduroso e extremamente indigesto.
Ai daqueles que nunca saborearam uma feijoada num sábado à tarde!
Infeliz aquele que por medo do sabor, preferiu viver de coisa insossa.
Minha vó diz que comida sem sal é comida sonsa.
Eu prefiro o termo "sonsa" à "insossa".
Faz mais sentido.
O Deus-misturado-em forma-de-gente-e-samba,
Que trate de preparar uma feijoada pra quando chegarmos ao céu!
"Devemos ir também aos gentios"
Misturar-se ao caldeirão fervente do universo
É ser tempero de sentido, é ser sal.
Num mundo enfastiado de gente "sonsa-pura",
Misturar é a verdadeira obediência.
E comer feijoada é uma atitude de liberdade.

Um comentário:

mariab disse...

“Não é bastante amar, é preciso prová-lo” (Santa Teresinha )

Padre Thiago, você é demais! Que delícia de texto! Paz! Beijão