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terça-feira, 9 de outubro de 2012

Divórcios

Separar-se em dois, três, vários.
A existência já é um divórcio,
Porque constantemente nos dividimos em muitos.
Aquilo que somos só se revela por aquilo que não somos.
Identificar-se é um suicídio.
No amor, acontece a mesma coisa.
No princípio é o abismo.
E uma escuridão tremenda em forma de suspeita se levanta.
Há um outro enorme em forma de rosto.
Os sete buracos da cabeça evocam o vazio-vazado do risco.
Relacionar-se é um mergulho.
Mais: é um salto ornamental.
Exige criatividade na queda.
O outro é sempre mais fundo do que alcançamos com nossos pés.
Assim, o "ir-em-direção-ao-que-se-ama" é o primeiro divórcio:
O divórcio de si,
Do porto seguro das próprias certezas.
Todo sentimento-sentido, diante do outro, se transforma em criança.
Não existe relacionamento que se sustente sem um pouco de ingenuidade.
E também de cinismo.
O amor iça as âncoras.
Ele levanta as velas.
E se constrói a partir de um remar constante,
Fatigante,
E, às vezes, chicoteado pela insanidade.
É no romper das cordas que o amor acontece.
Não, ele não é feito de segurança.
Muito menos de certezas.
Ele não é feito de praias,
Mas de oceanos inalcançáveis pelos olhos.
O pior adultério é o da hipocrisia.
A pior infidelidade é a da ilusão da estabilidade.
O barco, para continuar navegando,
Precisa saber se mover com as ondas.
É balançando com o mar que se aprende a ficar em pé na proa.
Quando eu faço do outro um ídolo,
E o engaiolo em minhas frágeis grades de insegurança,
Ele já não é outro.
É um eu-desajeitado em forma de medo.
O abismo deve sempre ser considerado intransponível,
E não há pontes, por mais seguras que possam parecer,
Capazes de derrotá-lo.
Entretanto, há barcos, remos, e cansaço.
O amor é feito de mares tempestuosos, e ondas e monstros submersos,
Afogar-se será sempre um possibilidade.
Eles permanecerão turbulentos,
Queira você ou não.
E, por isso mesmo,
São apaixonantes.
O divórcio com o outro
Começa quando não se aprende a divorciar-se de si.

3 comentários:

Suely Melo disse...

Interessante. Tocante. Há tanta profundidade em suas palavras.
Ai de quem nunca mergulhou e afogou-se nos profundos e turbulentos mares do amor. Este nunca viveu. P/ mim, amar é isso; é pular de olhos vendados rumo ao desconhecido, o outro. É ele quem nos move. É na relação que nos despimos de nossas certezas, que nos encontramos, nos perdemos, nos encontramos de novo... Isso é fascinante. No salto, às vezes se morre, sim, mas outras, de alguma forma, se salva. Vale muito a pena correr o risco. Amar também dói, mas, ao mesmo tempo, transporta-nos para além de nós.

* Q lindo esse “ir-em-direção-ao-que-se-ama”, como o divórcio de si. Entregar-se.
Bjs.

mariab disse...

“Que lindo e simples resumo da tarefa da educação! Plantar jardins, mudar o mundo, torná-lo belo e manso. Aprender construindo. Aprender fazendo. Para que as crianças possam brincar. Para que os adultos possam voltar a ser crianças. E espalhar sonhos, porque jardins, cidades e povos se fazem com sonhos”.(Rubem Alves)
Cum Deus!beijos

mariab disse...

“Eu sei que vou, insisto na caminhada. Se amanhã o que eu sonhei não for aquilo, eu tiro um arco íris da cartola e refaço, colo, pinto e bordo” (Caio Fernando de Abreu)

Bom domingo! Dia do Senhor! Dia de renovar a Aliança! Bj no teu coração .